Covid volta a lotar hospitais; médico critica negligência da população
Mesmo com sintomas gripais, pessoas têm demorado a fazer o teste da Covid, o que tem ajudado na propagação do vírus

Número de contaminações em alta, pronto atendimentos cheios, alta na procura de testes e hospitais trabalhando com capacidade de internação acima da média. Por muito tempo essa foi a realidade vivenciada em Mato Grosso durante a pandemia da Covid-19, a maior crise sanitária do país.
Mais de dois anos desde que tudo começou, o cenário volta a repetir o quadro vivido no ápice da pandemia, com as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) dos hospitais registrando ocupação acima de 80%. E agora, com um agravante: mesmo com imunizantes disponíveis, somente 23,77% da população do estado tem o ciclo vacinal completo.
De acordo com os números da Secretaria Estadual de Saúde Mato Grosso (SES-MT), adultos e adolescentes são os que menos procuraram se proteger com a aplicação de dose de reforço, registrando um percentual de 15,48% e 18,40%, respectivamente. Ao longo do último mês, o Estado tem registrado um aumento crescente – e alarmante – no número de casos. Na última semana de junho, foram 12 mil pessoas infectadas. Atualmente, há 15.039 pessoas em monitoramento com suspeitas ou complicações da contaminação pelo coronavírus.
Coordenador do Pronto Atendimento do Hospital Santa Rosa, em Cuiabá, o médico Pedro Luiz Pigueira revela que o número de pacientes com sintomas gripais aumentou consideravelmente, no entanto, a população tem demorado para procurar atendimento médico ou para fazer o teste da Covid. Dos casos suspeitos que chegam na unidade, a maioria é confirmada como infecção pelo vírus.
“Nesses últimos três meses, os atendimentos aumentaram em cerca de 400%, sempre com sintomas gripais, uma coisa que tinha parado”, relatou.
Luiz Alves
Uso de máscaras, principalmente quando se tem sintomais gripais, precisa ser retomado
Em geral, considerando os hospitais públicos e particulares, Mato Grosso tem cerca de 440 pessoas internadas, sendo que 100 estão em UTIs. Segundo Pigueira, as internações no Hospital Santa Rosa por Covid permanecem estáveis. O que mudou, salienta, é o perfil dos pacientes. Graças à vacina, o número de casos graves – ao menos no hospital em que ele atua – é menor.
“A gente sabe que as vacinas não vieram para evitar a infecção, mas vieram para diminuir a gravidade e mortalidade dos casos. Isso tudo se reflete no que estamos vendo agora”, afirmou.
No entanto, segundo dados divulgados pelo Governo do Estado na última semana de junho, a realidade dos hospitais públicos era outra: mais de 90% dos internados nas UTIs eram pacientes que não completaram o esquema vacinal.
Pigueira cita que a vacinação é um direito individual e que cabe a cada um decidir se quer ou não se imunizar. Apesar de a ppessoa vacinada não ficar blindada de pegar a doença, ele salienta que não há o que se negar quanto ao benefício que ela traz. Para o médico, é preciso que a população tenha ciência das consequências que não se imunizar pode causar.
“Está mais que comprovado a eficácia delas na diminuição da gravidade, e o reflexo está, aos nossos olhos, nos casos das pessoas vacinadas que contrariam Covid e mesmo assim só apresentaram casos leves”, salientou.
Negligência da população
Como muitos profissionais da área da saúde, o coordenador afirma que a circulação do vírus Covid-19 será uma realidade no cotidiano das pessoas. Apesar da doença não terá mais um poder letal tão grande, ela seguirá com alta capacidade de contaminação.
“A gente está pegando, infelizmente, casos muito tardios e por isso não conseguimos barrar o curso de transmissão da doença”
Pedro Luiz Pigueira, médico
“Acredito, e isso é uma opinião minha, que as doses de reforço serão uma realidade na nossa vida. De meses e meses, ou talvez de anos em anos, será preciso fortalecer nosso sistema imunológico para enfrentar esses picos, que eu também acredito que serão recorrentes”, avalia.
Ciente da grande possibilidade de transmissão e mutação, mas confiante na eficácia da vacinação contra a Covid-19, o médico diz que o que o mais o preocupa é o comportamento da população, que tem sido negligente ao demorar para tomar as providências necessárias quando começam a apresentar sintomas gripais.
“As pessoas estão ficando gripadas e mesmo assim indo trabalhar, para shoppings, saindo para shows e bares, não se preocupam em fazer o teste. Aí esperam de 6 a 9 dias de sintomas para ir em busca de atendimento. E quando chegam na unidade, descobrem que estão com Covid. Ou seja, passaram todo esse tempo transmitindo, sem tomar nenhum cuidado”, criticou.
Ao , o médico afirma que as pessoas precisam entender que qualquer sintoma gripal pode ser Covid. Segundo Pigueira, elas não se testam por não quererem estar contaminadas ou por não acreditarem na doença, e o fato de os sintomas serem muito semelhantes aos de outras infecções virais agrava a situação.
“A gente está pegando, infelizmente, casos muito tardios e por isso não conseguimos barrar o curso de transmissão da doença. Quando o paciente já está com 5 ou 9 dias de transmissão, não interfere no diagnóstico, porque os sintomas leves serão os mesmos. Mas neste tempo, o paciente com certeza não estava usando máscara, não estava se cuidando, mantendo isolamento. Pelo contrário, está convivendo com dezenas de pessoas e isso é um problema”, ressaltou.
Vivendo diariamente a rotina de PA e enfrentando os diversos desafios que a pandemia vem impondo, o coordenador acredita que a conscientização coletiva é um dos principais meios de combater a Covid-19.
“Temos uma necessidade de conscientização muito grande. Como pouquíssimos lugares exigem o uso de máscara, as pessoas não se protegem. Mesmo com sintomas de gripe, as pessoas não se conscientizam para barrar esse sistema de transmissão. E é somente com a consciência coletiva que podemos enfrentar essas instabilidades sanitárias, que não temos como prever”, alertou.